Quando Iniciar a Restrição de Fósforo na Dieta do Paciente Renal Felino?

O fósforo é um mineral essencial para diversas funções no organismo dos gatos, como a formação de ossos e dentes, além do metabolismo energético e da função celular. No entanto, em pacientes com doença renal crônica (DRC), o excesso de fósforo pode ser extremamente prejudicial, atuando como um acelerador da progressão da doença.

Dr. Reginaldo Pereira

4/9/20254 min ler

A Relação Fósforo-Doença Renal Crônica

Na DRC, a capacidade dos rins de excretar o fósforo diminui progressivamente, levando à hiperfosfatemia (níveis elevados de fósforo no sangue). Essa condição desencadeia uma série de alterações hormonais complexas, como o aumento do hormônio da paratireoide (PTH) e a diminuição da ativação da vitamina D (calcitriol). Essas alterações afetam drasticamente o metabolismo do cálcio e do fósforo, contribuindo para a progressão da doença renal e causando a osteodistrofia fibrosa, também conhecida como "borracha da mandíbula", devido à reabsorção óssea.

A hiperfosfatemia é um indicador negativo que exige intervenção imediata. Níveis elevados de fósforo, especialmente quando combinados com níveis elevados de cálcio (produto cálcio-fósforo elevado), aumentam significativamente o risco de mineralização de tecidos moles, como rins, coração e vasos sanguíneos, acelerando a progressão da DRC e piorando o bem-estar do paciente. Imagine o fósforo em excesso como um "cimento" que se deposita onde não deveria, prejudicando a função dos órgãos.

O Excesso de Fósforo em Gatos Saudáveis

As preocupações com o fósforo não se restringem apenas a gatos com DRC. Estudos recentes sugerem que o excesso de fósforo dietético, mesmo em gatos adultos saudáveis, pode ser prejudicial a longo prazo, predispondo ao desenvolvimento de problemas renais.

Pesquisas demonstraram que a exposição contínua a altos níveis de fósforo altamente biodisponível (presente em ingredientes de baixa qualidade) pode levar a alterações indicativas de dano renal precoce, como proteinúria (proteína na urina) e aumento da creatinina sérica, que podem progredir silenciosamente para DRC. Essas alterações podem ocorrer rapidamente e não são necessariamente reversíveis, reforçando a importância de considerarmos a qualidade e a quantidade de fósforo nas dietas de todos os nossos pacientes felinos, desde filhotes até idosos.

Quando Iniciar a Restrição de Fósforo?

A restrição de fósforo na dieta é fundamental no manejo da DRC, mas o momento ideal para iniciar essa restrição pode variar dependendo do estágio da doença, da resposta individual de cada paciente e da presença de outras comorbidades.

Em gatos com DRC em estágios iniciais (1 e 2 de IRIS - International Renal Interest Society), dietas específicas para essa fase, com uma restrição moderada de fósforo (geralmente entre 0.3% e 0.6% de fósforo na matéria seca), podem ser apropriadas. O monitoramento contínuo de PTH e FGF-23 (Fator de Crescimento de Fibroblasto 23) pode fornecer informações valiosas sobre o metabolismo do fósforo, mesmo em casos com fósforo sérico ainda dentro da normalidade, auxiliando na decisão de intensificar a restrição dietética. Por exemplo, um gato no estágio 2 com fósforo sérico normal, mas com PTH elevado, pode se beneficiar de uma dieta com menor teor de fósforo.

É crucial lembrar que o fósforo é um nutriente essencial e a restrição excessiva e precoce pode ser prejudicial, havendo relatos de aumento do risco de hipercalcemia em alguns casos, especialmente se a dieta for excessivamente restritiva em fósforo e pobre em vitamina D. Além disso, a restrição excessiva pode levar à perda de massa muscular (sarcopenia), um problema comum em gatos com DRC.

Ligantes de Fósforo vs. Dietas Renais Terapêuticas

Em casos onde a restrição dietética de fósforo não é suficiente para controlar a hiperfosfatemia (fósforo sérico acima de 6.0 mg/dL), os ligantes de fósforo (como carbonato de cálcio, sevelamer ou lanthanum carbonate) podem ser utilizados como uma ferramenta adicional. Eles atuam "capturando" o fósforo no trato gastrointestinal, impedindo sua absorção. No entanto, é fundamental entender que eles não substituem os benefícios de uma dieta renal terapêutica. Eles são um complemento, não uma solução isolada.

As dietas renais são formuladas com diversas modificações importantes, além da redução de fósforo, como níveis controlados de proteína de alta digestibilidade (para minimizar a produção de ureia), suplementação de vitaminas do complexo B (perdidas na urina), antioxidantes (para combater o estresse oxidativo) e ácidos graxos ômega-3 (EPA e DHA), que possuem propriedades anti-inflamatórias e contribuem para a saúde renal e o bem-estar geral do paciente. Imagine a dieta renal como um "pacote completo" de cuidados para o gato com DRC.

Orientando os Tutores

Diante da complexidade das informações e da falta de clareza nos rótulos dos alimentos para gatos, orientar os tutores na escolha da dieta ideal para seus gatos pode ser desafiador. A principal recomendação é priorizar fabricantes com boa reputação, que invistam em pesquisa, controle de qualidade rigoroso e possuam expertise comprovada na formulação de dietas balanceadas para gatos com DRC. Esses fabricantes geralmente estão mais atualizados com a ciência nutricional e tomam medidas para minimizar o uso de fontes de fósforo altamente biodisponíveis, como farinhas de ossos e fosfatos inorgânicos, optando por fontes de fósforo de origem animal e vegetal de alta qualidade.

Além disso, incentive os tutores a lerem atentamente os rótulos dos alimentos, buscando informações sobre o teor de fósforo na matéria seca e a lista de ingredientes. Desconfie de alimentos com ingredientes genéricos e excesso de aditivos artificiais.

Conclusão

O fósforo desempenha um papel central na saúde dos nossos pacientes felinos, e sua gestão adequada, especialmente em gatos com DRC, é crucial para melhorar sua qualidade de vida, retardar a progressão da doença e prolongar sua sobrevida. Compreender a biodisponibilidade do fósforo, as limitações das informações nos rótulos, a importância do monitoramento contínuo (fósforo sérico, PTH, creatinina) e a individualização do tratamento nos permite tomar decisões mais informadas no manejo dietético. Ao priorizarmos dietas de fabricantes confiáveis, considerarmos as particularidades de cada paciente e educarmos os tutores sobre a importância da nutrição renal, podemos otimizar a saúde renal e o bem-estar geral de nossos amigos felinos, proporcionando-lhes uma vida mais longa e confortável.